Existem portugueses que se destinguem sem nunca receberem nenhuma medalha, comenda ou ordem, fazem-no dignificando anónimamente o nome de Portugal pelo seu denodado esforço, vontade, mestria e sabedoria. Este é o caso do falecido amigo e radioamador Tiago Frederico, residente em Nagozelo do Douro, S. João da Pesqueira-Viseu.
Desde a adolescência se distinguiu como aluno brilhante do Liceu de Lamego, onde granjeou fama nacional durante o regime salazarista conservador quando foi identificado e indiciado por desenvolver um sistema de intercomunicação rádio dessimulado na gola de um casaco para auxiliar o irmão a realizar o exame. Vivia-se o pós-guerra e na altura foi admiração geral que uma criança desenvolvesse um sistema deste tipo construido por si com processos rudimentares!
A estupefação foi tal que a notícia saiu nos grandes jornais da época, o que impediu a expulsão do Liceu dos dois manos Frederico. Mais tarde foi estudante do Instituo Superior Técnico e radicou-se em Lisboa onde pontuaria na Rede de Emissores Portugueses nas tertúlias técnicas, construindo e ajudando outros Radioamadores a construir os seus equipamentos. Na altura existiam poucos equipamentos comerciais e o preço era proibitivo, pelo que o Tiago era um grande cliente dos sucateiros na compra da sucata militar para construção de equipamentos de rádio. A guerra colonial apanharia o Tiago ainda antes de terminar o curso de engenharia electrónica, tendo sido elevado ao posto de capitão de transmissões até ao 25 de Abril de 1974 quando foi desmobilizado, tendo ocupado na Guiné-Bissau um lugar de destaque na instrução e supervisão dos sistemas de telecomunicações militares do Exército Português. Ainda me recordo de uma das suas inumeras histórias em que estabelecia contactos regulares nas bandas de radioamador com outros radioamadores, mas do lado inimigo, na altura PAIGC! Nessa altura o Tiago construiu equipamentos de transmissões na Guiné-Bissau com os quais conseguiria efectuar o primeiro contacto por satélite de uma estação de rádio portuguesa nos anos 70. Após o 25 de Abril dedicou-se à viticultura na quinta familiar e ao Radioamadorismo tendo sido pioneiro nas transmissões por reflexão lunar de rádio, exploração da banda de 50MHz onde instalou o primeiro radio-farol em Portugal e transmissão em UHF e SHF. O falecimento por doença súbita nos inicios da década de 90 apanhou toda a comunidade de surpresa, numa altura em que era referência internacional com participação em inumeras conferencias e jornadas técnicas na Europa e Américas, vários artigos e estudos publicados na imprensa especializada e influência no núcleo jovem de radioamadores entusiastas das Frequências elevadas. Apesar dos muitos artigos que publiquei sobre o Tiago na Revista QSP, não concretizei um trabalho biográfico que se impunha! Bem-hajas por tudo Tiago.
